A Igreja Céltica

De todos os santos célticos Patrício deve ser o mais conhecido. O dia de sua festa, 17 de março, é celebrado onde quer que os irlandeses e seus descendentes se reúnam. A Patrício é atribuída a conversão das tribos celtas pagãs da Irlanda ao Cristianismo, e a Irlanda se tornaria o centro da Igreja Céltica. As legiões do Império Romano nunca chegaram à Irlanda e, em consequência, a Igreja desenvolveu uma organização em grande medida livre da influência papal, caracterizada pela proliferação de monastérios. Isso também ocorreu em outras regiões célticas na periferia da Europa Ocidental, sobretudo a Escócia e o País de Gales, onde o domínio de Roma era incompleto.

Com o colapso do Império Romano, foi a Igreja Céltica que manteve acesa a chama do Cristianismo. Nos séculos seis e sete, seus missionários viajaram por toda a Europa em sua batalha contra o paganismo. A maioria dos santos célticos pertence àquela idade de ouro da Igreja Céltica. Suas histórias devem ser uma mescla de fato e de lenda. Os fatos são certamente discerníveis nas ruínas de suas construções e, menos frequentemente, nas biografias fantasiosas escritas séculos após suas mortes. Mas, onde há histórias de milagres, quem poderá saber onde acaba a verdade e começa o mito? A seguir temos duas breves descrições da vida e obra de São Patrício padroeiro da Irlanda.

Patrício da Irlanda

Muito da vida de Patrício é envolto em mistério e os historiadores diferem quanto à provável cronologia da vida do santo. Felizmente, ele legou-nos dois documentos, sua Confissão e sua Carta a Coroticus, que descrevem algumas de suas experiências. Ele não foi o primeiro missionário cristão a chegar à Irlanda, mas a ele pertencem os principais créditos pela conversão da ilha pagã e pelo estabelecimento da Igreja Céltica.

Ele era filho de um oficial romano, Calpurius, que vivia provavelmente no País de Gales. Patrício, aos dezesseis anos, foi capturado em uma emboscada e vendido como escravo ao chefe de um clã irlandês, Milchu. Passou anos na escravidão, tomando conta de um rebanho no Monte Slemish, Condado de Antrim. Fugiu seguindo os ditames de uma voz lhe disse que um navio o estaria esperando para levá-lo ao seu país. Após uma jornada de 320 quilômetros ele encontrou o navio e, no final, conseguiu voltar para sua família.

Certa noite, em um sonho, ouviu vozes chamando-o de volta à Irlanda. Acredita-se que ele estudou com São Germano, em Auxerre, França, e que sua missão na Irlanda foi aprovada devido à morte precoce de São Paládio, que havia sido enviado, em 431, como bispo dos irlandeses que “acreditavam em Cristo”. Consequentemente, 432 é a data tradicional da viagem de Patrício à Irlanda, que terminou nas praias de Strangford Lough. Ele rapidamente converteu um chefe local chamado Dichu, que lhe doou um grande celeiro em Saul, Condado de Down, para sua primeira igreja.

Não muito tempo depois, Patrício dirigiu-se para a Colina de Tara, Condado de Meath, onde vivia um grande rei da Irlanda. Chegando às vésperas da Páscoa, acendeu o fogo pascal na adjacente Colina de Slane. Nessa época do ano, em Tara, era uma prática pagã apagar todos os fogos antes de acender-se outro. Os druidas de Tara ao verem a luz em Slane, advertiram o rei Laoghaire que devia extingui-lo ou ele queimaria para sempre.

Patrício foi convocado à Tara. No caminho, ele e seus seguidores, cantaram o hino conhecido como “A Lorica” ou “Peitoral de São Patrício”. Embora o rei Laoghaire tenha permanecido pagão, ficou tão impressionado com o santo que lhe deu permissão para fazer conversões em todo o seu reino. A Vida de Patrício, de Muirchu, escrita dois séculos mais tarde, narra uma disputa de magia na qual os druidas do rei Laoghaire tiveram que conceder a vitória ao santo.

Patrício viajou amplamente pela Irlanda, fazendo conversões e fundando novas igrejas, embora depois de algum tempo tenha estabelecido o centro de suas atividades em Armagh. Certa ocasião passou os quarenta dias da Quaresma no Condado de Mayo, agora chamado de Croagh Patrick. Lá ele foi atormentado por demônios na forma de pássaros negros, que se agrupavam em tão grande quantidade que o céu escureceu, mas ele continuou a rezar, e a bater seu sino para dispersar os pássaros que o atacavam. Um anjo então apareceu e disse ao santo que todos os seus pedidos para o povo da Irlanda seriam concedidos, e que eles reteriam sua fé cristã até o Dia do Juízo Final. Há muitas lendas sobre Patrício. Por exemplo, a de que ele teria banido todas as cobras da Irlanda e de que adotou o trevo de três folhas como símbolo da Santíssima Trindade (planta que é emblema nacional da Irlanda).

Os escritos de Patrício pertencem à última parte de sua vida e confirmam que ele era menos erudito como escritor, do que era convincente como orador. Não obstante, Confissão, uma resposta às críticas de sua missão na Irlanda, é uma comovente revelação de sua vocação e da orientação divina que ele recebia em sonhos. Os anais irlandeses dão 493 como a data da morte de Patrício, mas uma data anterior – 461 – parece ser a mais provável. Reza a tradição que ele morreu em Saul e foi enterrado nas proximidades, em Downpatrick.


São Patrício, o Apóstolo da Irlanda

O santo padroeiro da Irlanda, Patrício, nasceu no noroeste da Grã-Bretanha, filho de um diácono da igreja e neto de um padre cristão. Aos 16 anos, foi capturado por piratas e vendido como escravo na Irlanda, onde começou a explorar por si mesmo os mistérios da religião cristã. Em sua autobiografia, uma das poucas peças de escritos celtas onde a autoria é conhecida, Patrício escreve: “Eu tive que ficar a noite toda nas florestas e nas montanhas cuidando das ovelhas, e eu acordava para rezar antes do amanhecer em todos os climas; neve, geada e chuva, não tive medo, nem tive sono, porque o Espírito de Deus era tão fervoroso dentro de mim”.

Depois de seis anos de escravidão, Patrício foi instruído por uma voz, segundo alguns em um sonho, para deixar a Irlanda e voltar para sua casa. Escapando de seu mestre, Patrício foi guiado por cerca de 200 milhas (cerca de 320 km) até um navio que o levou de volta à Grã-Bretanha.

Eventualmente, ele voltou para sua casa, de onde foi enviado para ser treinado e ordenado sacerdote. Patrício teve uma série de sonhos que o convidaram a retornar mais uma vez à Irlanda como missionário e, contra os desejos de sua família, ele fez seu caminho pela Grã-Bretanha, possivelmente via Auxerre na Gália, até chegar em Armagh na Irlando, por volta de 433 DC.

Já havia alguma atividade missionária na Irlanda, e Patrício trabalhou incansavelmente batizando e confirmando cristãos, e ordenando aqueles com educação e um chamado ao sacerdócio. Embora não fosse monge, ele encorajou homens e mulheres a abraçar a vida monástica, e seu profundo amor e cuidado pastoral pelo povo da Irlanda o levaram a viajar por muitos lugares daquela ilha, levando o evangelho àqueles que seguiam os antigos cultos druídicos.

Diz a lenda que Patrício acendeu uma fogueira em comemoração à Páscoa na mesma noite em que Loegaire, um alto rei da Irlanda, estava acendendo sua própria fogueira para celebrar o renascimento da primavera. Irritado, o rei chamou seus sacerdotes druidas, e ficou ainda mais enfurecido quando eles profetizaram que o fogo que Patrício acendeu queimaria para sempre, superando o fogo do próprio rei.

O rei Loegaire, então, liderou um exército até a montanha de Tara e, enquanto desafiavam Patrício, viram-no erguer os braços em oração antes de fugir para a noite com seus discípulos. Outras provas de força se seguiram, mas a proteção divina de Patrício sempre provou ser superior àquela dos sacerdotes druidas. Eventualmente, o rei permitiu que Patrício pregasse o cristianismo em seus reino, embora ele próprio permanecesse resolutamente pagão.

Patrício, diz a lenda, teria ensinado o mistério da Trindade usando o trevo como sua ilustração. Em um único caule, três folhas separadas são unidas para formar um único todo, como Deus Pai, Filho e Espírito são três que formam um todo perfeito. A Patrício também é creditado o “Peitoral de São Patrício”, um hino de proteção provavelmente pertencente ao século VIII, simbolizando o caim (uma forma tradicional de oração que cercava a pessoa com um círculo imaginário, não de magia, mas da presença divina, a protegendo do mal).

Patrício morreu perto de Wicklow, no local onde começou sua viagem missionária. Muitos afirmaram possuir relíquias dele, embora o local de seu enterro seja desconhecido. A formação romana de Patrício o encorajou a organizar a Igreja Irlandesa, com bispos poderosos que impunham disciplina moral e espiritual. A Igreja Céltica preferiu abraçar uma tradição ascética onde monges e freiras ensinavam a religião pelo exemplo de sua fé. Mas por causa do zelo de Patrício, a Igreja Irlandesa tornou-se um farol de luz em uma Europa escura, e a Idade de Ouro dos Santos Célticos começou.

Parte do “Peitoral de São Patrício”

Eu conclamo todo o céu com seu poder
O sol com seu brilho
A neve com sua brancura
O fogo com toda a força que tem
O relâmpago com sua potência veloz
Os ventos com sua rapidez ao longo de sua passagem
O mar com sua profundidade
As rochas com sua firmeza
E a terra com sua severidade.
Tudo isso eu conclamo, pela ajuda e graça onipotente de Deus,
Que se coloque entre mim e os poderes das trevas.